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Um estudo desenvolvido em Botucatu envolvendo o cultivo consorciado de sorgo granífero e capins perenes tropicais tem alcançado significativa repercussão no meio científico internacional voltado para a agropecuária. Parte da tese de doutorado do engenheiro agrônomo Gustavo Pavan Mateus, pesquisador da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA/Andradina), orientado pelo professor Carlos Alexandre Costa Crusciol, da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Unesp, o trabalho foi inicialmente publicado na forma de artigo científico no Agronomy Journal, considerado um dos mais renomados periódicos da área agrícola no mundo.
A pesquisa também saiu na revista de divulgação científica CSA News e acabou por se tornar o primeiro estudo da Unesp a ser publicada como uma “web story”, ou seja, uma matéria jornalística divulgada nos sites da American Society os Agronomy (ASA), Crop Science Society of America (CSSA) e Soil Science Society of America (SSSA) e divulgada junto a veículos de notícias ligados ao meio rural nos Estados Unidos.
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O destaque obtido pelo trabalho reflete a amplitude internacional das possibilidades de aplicação e o potencial de impacto econômico e social do sistema de cultivo integrado estudado pelo grupo responsável, que envolve pesquisadores da FCA, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da Unesp, Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA/USA) e a Universidade Estadual da Carolina do Norte (NCSU/USA).
A pesquisa
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O estudo com o sorgo consorciado faz parte de um conjunto de pesquisas que teve início há cerca de 15 anos, sob a orientação do professor Crusciol e com apoio da Fapesp. São trabalhos que buscam estudar os mais diversos aspectos dos sistemas de integração lavoura-pecuária (ILP) tanto como alternativa na recuperação de áreas degradadas e sua reutilização eficiente para a agricultura quanto na sua introdução em áreas tradicionais de culturas graníferas.
Neste trabalho, os pesquisadores testaram o cultivo do sorgo granífero consorciado com o capim-marandu (Urochloa brizantha cv Marandu), popularmente conhecido como braquiarião e também consorciado com o capim-mombaça (Panicum maximum cv Mombaça). O objetivo foi avaliar qual das duas espécies apresenta melhores resultados em termos de menor estresse por competição entre as plantas pelos nutrientes, produtividade de grãos, produção e qualidade de pastagem e eficiência do uso da terra. “No campo, precisamos diminuir ao máximo a competitividade entre as culturas consorciadas para que cada uma expresse plenamente seu potencial e traga o resultado esperado, ou seja, produzir a mesma quantidade que o sorgo produziria num cultivo exclusivo e ainda ter o capim no pasto”, explica Cristiano Magalhães Pariz, pós-doutorando pela FMVZ e um dos autores do artigo científico.
O sorgo é uma excelente cultura para o sistema de semeadura consorciada. Ele é bastante tolerante a áreas com solos menos férteis e apresenta menor exigência hídrica em relação a cultura do milho, por exemplo. Os capins testados, por sua vez, podem ser utilizadas para a alimentação animal ou produção de palhada para o sistema de plantio direto. Tanto o capim-mombaça quanto o capim- marandu são tolerantes e bem adaptados a regiões de baixa pluviosidade e altas temperaturas.
Os resultados alcançados pelos experimentos mostraram que a semeadura do sorgo consorciado ao capim-marandu teve um melhor desempenho em relação ao consórcio com o capim mombaça. A produtividade de grãos ficou em níveis similares aos obtidos pelo cultivo do sorgo “solteiro” (não consorciado). “Tivemos uma diferença considerável entre os capins testados. O capim-marandu é menos competitivo com o sorgo e proporcionou melhores resultados de produção de grãos, além de formar um bom pasto. O capim mombaça é mais agressivo e fez reduzir a produtividade de grãos, mesmo com uso da adubação nitrogenada em cobertura”, relata Pariz.
A adubação também foi um dos objetivos centrais do estudo. Os resultados experimentais determinaram que a demanda de nitrogênio para a viabilidade do cultivo consorciado é acima de 100 kg por hectare, aplicado em cobertura na cultura do sorgo. A pesquisa de Mateus é a primeira a estabelecer um parâmetro para recomendações de adubação nitrogenada em cultivos de sorgo consorciado. “O trabalho mostrou que a quantidade de nitrogênio recomendada pelo boletim que temos no Estado de São Paulo para o cultivo de sorgo “solteiro” não atende as exigências do sistema consorciado e, se for utilizada, não trará o resultado esperado”, explica o professor Crusciol. “É viável fazer o consórcio com capim-marandu. Mas é preciso adubar a cultura do sorgo consorciado com os capins visando o sistema como um todo, pois após a colheita dos grãos no verão e outono, o pasto também necessitará de nitrogênio para crescer”.
Vantagens
Segundo os pesquisadores, as vantagens do cultivo consorciado entre sorgo e capim-marandu são muitas. A primeira elencada por eles é a possibilidade de sua utilização em zonas do planeta com graves problemas de déficit alimentar. “Esse sistema é uma excelente opção para algumas regiões da África, onde se vive de agricultura de subsistência. No Brasil, o sorgo é usado principalmente para a alimentação animal, mas na África é muito utilizado para consumo humano”, conta Crusciol. “Como o sorgo e a capim-marandu são africanos, a implantação do sistema é muito viável ali, como também em algumas regiões da Ásia, na Austrália e no nordeste brasileiro”.
A adequação das doses de nitrogênio requeridas pelo sistema também refletem positivamente no bolso do produtor, segundo Pariz. “Não é preciso adubar o sorgo e depois o pasto. A adubação correta do sistema perdura por maior período e o pasto continua produtivo, ou seja, aumenta a eficiência de utilização de fertilizantes na produção de grãos ou mesmo carne, no caso do uso para a produção animal”.
A pesquisa também atestou a maior eficiência do uso da terra no sistema integrado, como afirma o professor Crusciol. “Com a aplicação de dose adequadas de nitrogênio para o sistema de integração lavoura-pecuária, a eficiência do uso da terra aumentou em até 27% em relação à área onde o sorgo foi cultivado sem consórcio. Isso indica que, com a adubação adequada, é possível obter os mesmos resultados de produtividade utilizando uma área menor”.
Há ainda vantagens inerentes ao próprio sistema de consórcio de espécies. A recuperação de áreas degradadas, resgatando a produtividade e a rentabilidade desejada pelo produtor, a proteção do solo contra a erosão e o aumento da quantidade de matéria orgânica, proporcionando maior sequestro de carbono são exemplos de benefícios.
O sistema também propõe que a área agricultável fique ocupada por um período maior do ano. “Quando se realiza o consórcio no verão é possível utilizar a forrageira como pasto para a produção de carne e leite ou como palhada para o sistema de plantio direto, porque várias áreas de produção de grãos no Brasil, principalmente em regiões com inverno seco permanecem ociosas no outono, inverno e parte da primavera”, enfatiza o professor Crusciol. O docente revela que há estudos que demonstram que pasto de inverno no sistema de integração lavoura-pecuária, em certos casos, proporciona maior rentabilidade do que uma lavoura de grãos na segunda safra.
Repercussão
Segundo Pariz, esse sistema de integração já é bem difundido no Brasil. Ele acredita que o fator determinante para o destaque dado ao trabalho tenha sido seu potencial de aplicação em áreas carentes, especialmente no continente africano. “Talvez o estudo não tivesse o mesmo impacto se fosse publicado no Brasil. Como saiu numa revista de inserção internacional e em razão das culturas e do manejo utilizado poderem ser adotados em diversas regiões do mundo, a repercussão tem sido ótima”.
A pesquisa também marcou a primeira parceria da equipe do professor Crusciol com Alan Franzluebbers, do USDA e da Universidade Estadual da Carolina do Norte, considerado uma referência mundial no estudo de sistemas integrados de produção agropecuária. Atualmente há outros trabalhos em andamento que reforçam essa colaboração internacional. “O próprio Franzluebbers já se disse impressionado com a quantidade e a qualidade dos trabalhos produzidos no Brasil, envolvendo os sistemas integrados de produção”, atesta Crusciol. “É um exemplo de que o que fazemos tem sido interessante e inovador para a comunidade científica internacional”.
Fonte: Assessoria de Imprensa