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No dia 5 de abril, o italiano Andrea Papi, de 26 anos, foi atacado e morto por um urso enquanto corria na floresta de Monte Peller, na Província autônoma de Trento, no norte da Itália. Os exames genéticos identificaram que o animal responsável pela morte do rapaz é a ursa JJ4 também conhecida como Gaia, de 17 anos de idade. Em seguida, o presidente da Província de Trento, Maurizio Fugatti, decretou que fossem capturados e abatidos não apenas JJ4, mas também dois ursos machos, MJ5 e M62, que ele definiu como “problemáticos”.
Gaia foi capturada e seus três filhotes, de 1 ano e quatro meses, que estavam com ela no momento da captura, foram libertados ilesos. Mas o Tribunal Administrativo Regional acatou o recurso apresentado pela associação animalista LAV e suspendeu o abatimento de JJ4 até o dia 11 de maio, quando se pronunciará oficialmente sobre a questão. O animal está preso no centro de detenção da reserva faunística Casteller, enquanto aguarda a decisão sobre seu destino.
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O animal pode ser condenado a pena de morte, prisão perpétua ou a transferência para outro local. Segundo a LAV, a ursa pode ser transferida para uma reserva na Alemanha disposta a acolhê-la.
Decisão impopular
A situação se transformou em uma queda de braço entre o tribunal, apoiado pelos animalistas, e o presidente da província, Maurizio Fugatti. Membro da Liga, partido de extrema direita de Matteo Salvini, o político é conhecido por sua linha dura.
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Mas a inflexibilidade de Fugatti, que se recusa a voltar atrás em sua decisão, pode ir contra ele como um bumerangue. No próximo 22 de outubro haverá eleições provinciais no Trento. Há duas semanas o tema sobre o abate de JJ4 é destaque na imprensa italiana e divide a opinião pública.
Nas redes sociais, Fugatti chegou a ser acusado de “xenofobia plantígrada”. Segundo os internautas, ele é contra os ursos pardos alpinos porque são “estrangeiros na Itália”, enquanto o urso pardo marsicano é protegido, pois é “italiano nativo”.
Na verdade, o marsicano é uma subespécie que vive nas montanhas dos Apeninos em Abruzzo no centro da Itália e está ameaçado de extinção. Recentemente, o urso marsicano Juan Carrito morreu atropelado e causou imensa comoção em todo país. O diretor do Parque Nacional de Abruzzo, Luciano Sammarone, exprimiu que seu sofrimento dizendo que era “como se tivesse morrido um parente”.
Maioria contrária ao abatimento
Muitas celebridades se expressaram contra o sacrifício de Gaia e a favor da soltura dela em uma reserva. A Ordem dos Veterinários do Treno já se pronunciou contrária à eutanásia, “porque o exemplar é saudável”, e afirmou que “nenhum veterinário trentino sacrificará o animal”.
A família de Andrea Papi, o jovem morto pela ursa, disse que “não quer vingança, e que matar JJ4 não é justiça”. Segundo eles, “a verdadeira responsabilidade é das instituições”.
Em outros países da Europa, como Eslovênia, Áustria, Romênia e Finlândia já foram abatidos um total de cerca de 1000 ursos para controle demográfico destes grandes mamíferos, mas na Itália muitos se opõe. Várias pesquisas apontam que uma média de 80 % dos italianos é contrária ao abatimento de Gaia e de outros ursos.
Diversos grupos animalistas marcaram manifestações para este fim de semana em Trento. O delegado trentino, Maurizio Improta, declarou à agência de notícias Adnkronos que a região está sendo monitorada dia e noite por policiais.
O policiamento não é só por causa dos animalistas, mas principalmente para impedir pessoas que talvez queiram dar um passeio pelas montanhas do Trento só para tirar um self com o urso.
“Queremos evitar qualquer invasão na área protegida por turistas atraídos por notícias no final de semana e que querem fotografar de perto o animal”, declarou Improta.
A história da ursa Gaia
As letras JJ4 indicam o os nomes dos pais da ursa, Joze e Jurka trazidos da Eslovênia para a Itália no início da década 2000. Eles fazem parte do projeto Life Ursus, financiado pela União Europeia, para repovoar a população de ursos pardos alpinos que estavam quase extintos no país. O programa começou em 1999 com a introdução de quatro ursos machos e seis fêmeas nas florestas de Trento. O projeto tinha a intenção de aumentar a população para 40-60 ursos ao longo de algumas décadas, mas os animais se reproduziram mais do que o esperado.
Hoje estima-se que vivam cerca de 100-120 exemplares na região, que se aproximam cada vez mais de locais frequentados por humanos. Dois irmãos de JJ4 foram mortos. O primogênito, JJ1 também chamado de Bruno, morreu na Alemanha em 26 de junho de 2006 vítima de um caçador. O crime do animal foi roubar mel e caçar ovelhas. A outra irmã de Gaia, JJ3, foi capturada e abatida em 14 de abril de 2008 na Suíça porque confiava demais nos humanos e se aproximava da cidade sem medo. Enquanto o terceiro irmão, JJ2, desapareceu.
Os problemas do projeto Life Ursus
A LAV explicou que o projeto Life Ursus não funcionou porque muitas regras não foram respeitadas, entre elas, o uso de lixeiras com um sistema de fechamento a prova de urso. Portanto, os animais encontram facilmente restos alimentares dos humanos e se aproximam cada vez mais dos centros urbanos.
Com a abundância de alimentos, eles se reproduzem mais. É o que está acontecendo com os javalis que entram nas grandes cidades como Roma em busca de comida. Mas os ursos estão no topo da cadeia alimentar, portanto não existem outros predadores que representem um risco para eles.
No caso de Gaia, em 2020 ela já havia atacado outros dois humanos, pai e filho, ambos caçadores. Segundo a LAV, ela pode ter se sentido ameaçada pelos cães de caça. Na ocasião, esta associação animalista alertou que Gaia deveria ser esterilizada porque poderia atacar humanos para defender seus filhotes, como aconteceu recentemente.
Fonte: Agências