Anúncios
Uma operação resgatou 12 trabalhadores venezuelanos que estariam em condições análogas à escravidão trabalhando na colheita de laranja em uma fazenda de Cafelândia (SP). A operação aconteceu na última quinta-feira (23) e divulgada nesta segunda-feira (27) pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Segundo o MPT, os venezuelanos trabalhavam para um agenciador que trouxe o grupo de Boa Vista (RR), por intermédio da Operação Acolhida, com o apoio do Exército Brasileiro. Deram apoio à ação a Defensoria Pública da União (DPU) e a Polícia Federal (PF).
Anúncios
Na chegada do grupo, o agenciador, conhecido como “turmeiro”, confiscou os cartões-alimentação entregues aos trabalhadores em Boa Vista por uma organização que dá ajuda humanitária a refugiados e migrantes. No grupo havia uma criança e uma adolescente, que não estavam na situação de trabalho.
Em depoimento prestado ao MPT, um dos trabalhadores informou que o grupo assinou um pré-contrato contendo as condições de trabalho, com a promessa de registro em carteira de trabalho, salário de R$ 1,5 mil, jornada de 44 horas semanais e alojamento custeado pelo empregador.
Anúncios
Durante o período de trabalho, que foi de cerca de 20 dias, os trabalhadores não receberam nenhuma remuneração, exceto o valor de R$ 50, que teve que ser devolvido ao empregador para o custeio de alimentação.
Também não houve fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPIs), como luvas e botas, e não havia banheiros nas frentes de trabalho, ou mesas e cadeiras para refeição.
De acordo com o MPT, como nada disso foi cumprido os auditores fiscais do trabalho efetuaram o resgate, concedendo aos imigrantes o direito de receber as parcelas do seguro-desemprego de forma imediata.
Além disso, o turmeiro e o comprador da laranja deverão efetuar o registro em carteira de trabalho e decorrente rescisão do contrato de trabalho, com a obrigação de pagar as verbas rescisórias devidas, além de uma indenização por danos morais individuais no valor de R$ 5 mil para cada trabalhador.
Os beneficiários do serviço de colheita, representantes da fazenda, assumiram responsabilidade solidária pelo cumprimento do acordo, assinando um termo de ajuste de conduta com o MPT e a DPU.
Transporte e alimentação irregulares
Os venezuelanos chegaram ao interior de SP pelo aeroporto de São José do Rio Preto, e em seguida foram alojados na cidade de Júlio Mesquita, que fica a duas horas de ônibus do distrito de Bacuriti, onde fica a fazenda de laranja.
Para chegar ao local da colheita no distrito de Cafelândia, os venezuelanos pegavam o ônibus de madrugada, por volta de 5h, e retornavam ao alojamento em Júlio Mesquita às 17h. O trajeto era feita em veículo sem autorização do DER para o transporte de trabalhadores rurais.
A comida era feita por uma cozinheira venezuelana utilizando alimentos de cestas básicas fornecidas pela Prefeitura de Júlio Mesquita.
Também não foram fornecidas marmitas térmicas, de forma que os colhedores levavam suas refeições em pequenos potes de plástico, sendo obrigados a comê-las frias e com risco de azedar. Havia quatro galões de água para 12 trabalhadores, sem copos suficientes para todos.
Chegando a Júlio Mesquita, o turmeiro informou aos trabalhadores que apenas seriam registrados depois de um mês de trabalho. Em depoimento ao MPT, o turmeiro informou que o contratante direto seria a fazenda dona da plantação.
Por iniciativa própria, os trabalhadores deixaram de prestar serviços para o agenciador e foram embora de Júlio Mesquita no último dia 8 de junho.
O empregador, por sua vez, reteve os documentos dos imigrantes, incluindo CPFs e cartões-alimentação. Segundo os imigrantes, foram recuperados oito dos 11 cartões que estavam em posse do agenciador.
Os venezuelanos foram para Marília e foram acolhidos pela Secretaria de Direitos Humanos do Município, pernoitando em um abrigo municipal.
A própria secretaria efetuou o desbloqueio dos cartões dos trabalhadores, o que possibilitou que custeassem uma moradia provisória.
Mais venezuelanos agenciados
Em depoimento ao MPT, o agenciador afirmou que, para angariar a mão-de-obra dos venezuelanos, apresentou aos representantes da Operação Acolhida, em Boa Vista, o CNPJ de uma pessoa jurídica MEI utilizada para a venda de semijóias. Contudo, ele informou aos militares que os contrataria para serviços de empreitada.
Os integrantes da operação também levantaram que o mesmo turmeiro que submeteu os trabalhadores à condição análoga à escravidão em Cafelândia já possui um novo pedido junto ao Exército para trazer outros 40 venezuelanos para São Paulo.
“Vamos notificar o Exército Brasileiro sobre o resgate em Cafelândia a fim de impedir o envio de novos trabalhadores, além de recomendar o aprimoramento dos controles, checagem e fiscalização das empresas que solicitam a mão-de-obra de venezuelanos para utilizá-las em suas operações”, disse Marcus Vinícius Gonçalves, da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete).
Fonte: G1