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Era uma tarde comum de sexta-feira quando helicópteros, caminhões e um enorme efetivo de militares começaram a se deslocar para a cidade de Brumadinho (MG). A essa altura, todos já sabiam do rompimento da barragem da mina córrego do Feijão, da mineradora Vale, mas o tamanho do desafio ainda estava para ser dimensionado. Um ano após a tragédia – que será completado amanhã –, a maior operação de buscas da história segue no município, e sem previsão de ser encerrada.
Desde o fatídico dia, foram mais 4 mil horas de buscas capitaneadas pelo Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, que conseguiu localizar 270 corpos ou fragmentos já identificados. Entre os mortos estão funcionários da Vale e de empresas terceirizadas; moradores do município e turistas. Outras 11 vítimas permanecem desaparecidas.
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“Não é só uma operação de resgate de corpos e de cadáveres é, sobretudo, uma operação de resgate de dignidade, de dar a essas pessoas um acolhimento e mostrar que existe uma instituição que se importa com cada uma delas”, resumiu o porta-voz do Bombeiros, Tenente Pedro Aihara, durante um de seus vários pronunciamentos sobre o caso ao longo do ano.
A expectativa dos militares é encerrar as buscas somente após o resgate de todas as vítimas. Enquanto isso, a busca pelos 11 corpos que ainda restam na lama continua. Nesta semana, 75 bombeiros divididos em 17 equipes e 14 frentes de trabalho permaneceram na lama para dar continuidade ao resgate. Nem mesmo durante o Natal as buscas chegaram a ser interrompidas.
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‘Trabalho de formiguinha’
O rompimento da barragem da Vale espalhou ao longo de 98 quilômetros, mais de 13 milhões de m³ de rejeitos. É em meio a esse ‘mar de lama’ que os bombeiros precisam esquadrinhar cada centímetro de terra para tentar localizar, ao menos, um fragmento de corpo que possa ser identificado no IML (Instituto Médico Legal).
Com o passar do tempo, essa tarefa se torna cada dia mais difícil não só por conta da decomposição, mas pelo período chuvoso, que começou em dezembro. Com a lama molhada, o trabalho dos cães farejadores fica praticamente impossível.
Sem contar com o olfato dos cães, a corporação atual neste momento com escavadeiras que reviram o rejeito enquanto bombeiros tentam encontrar visualmente algum fragmento de corpo. Após isso, os militares peneiram essa terra em busca de novas vítimas.
Nesta semana os trabalhos de busca contaram com 94 máquinas pesadas e 28 caminhonetes trabalhando todos os dias.
Cadu Rolim/Fotoarena/Folhapress
SITUAÇÃO PODERIA TER SIDO EVITADA, APONTA MP
Nesta semana, um ano após o desastre, o Ministério Público de Minas Gerais apontou que, ao menos desde 2017, a barragem sob a responsabilidade da Vale e supervisão técnica da Tüv Süd apresentava “situação intolerável de riscos geotécnicos, com Fator de Segurança abaixo do mínimo aceitável”, o que poderia resultar no rompimento da estrutura. Toda essa situação era de conhecimento da empresa, mas nada foi feito.
Segundo a denúncia apresentada pelo MPMG, as apurações demonstraram que a Vale detinha internamente diversos instrumentos que garantiram amplo conhecimento da situação de segurança de suas barragens, “mas de forma sistemática ocultava essas informações do poder público e da sociedade incluindo investidores”.
Por conta do desastre, o Ministério Público denunciou a Vale, a Tüv Süd e 16 executivos das duas empresas por homicídio duplamente qualificado e crimes ambientais no caso do desastre da barragem do córrego do Feijão. O ex-CEO da mineradora, Fabio Schvartsman, está entre os denunciados.
William Garcia Pinto Coelho, promotor do inquérito contra a Vale, o executivo “conhecia seu negócio minerário, que tem riscos, como a situação da barragem de Fundão [da Samarco], mas mesmo assim fez do lema ‘Mariana nunca mais’ algo panfletário, não adotou medidas concretas”, acusou.
Em nota, a TÜV SÜD informou que as causas do desastre “ainda não foram esclarecidas de forma conclusiva” e que a empresa “reitera seu compromisso em ver os fatos sobre o rompimento da barragem esclarecidos”. A defesa de Fabio Schvartsman classificou o processo como ‘açodado e injusto’. Já a Vale informou que a denúncia é prematura ao apontar ‘assunção de risco consciente para provocar uma deliberada ruptura da barragem’.
‘Parece que foi ontem’
Quem mora em Brumadinho ainda convive com os traumas do dia 25 de janeiro de 2019. A cidade tem marcas de lama, e o rio Paraopeba está poluído. Com múltiplas fraturas, Talita Cristina Oliveira foi a última sobrevivente a deixar o hospital e luta para tentar ter uma vida normal: “Dizem que faz um ano, mas, para a gente, parece que foi ontem”. Segundo a prefeitura, entre 2018 e 2019, o uso de medicamentos antidepressivos cresceu 56%, e de ansiolíticos, 79%.
Fonte: Jornal Metro