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A Venezuela não sofreu uma guerra nem uma catástrofe natural, mas, em 2017, ocupou o quarto lugar na lista de países de onde sai a maior quantidade de novos pedidos de refúgio no mundo – e o primeiro, se considerada apenas a América Latina.
O direito de refúgio permite que pessoas que saem de seus países de origem perseguidas, ou sob risco, por causa de etnia, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, ou, ainda, devido a uma situação de grave e generalizada violação de direitos humanos, sejam protegidas em outro território.
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De acordo com um relatório divulgado na terça-feira pela Agência da ONU para Refugiados (Acnur) sobre as tendências globais em deslocamentos forçados, o número de venezuelanos que pediram esse tipo de proteção internacional somou 111,6 mil no ano passado, o triplo da quantidade registrada em 2016.
Com esse resultado, a nação sulamericana só foi superada por países que na última década sofreram com guerras devastadoras, como o Afeganistão, origem de 124,9 mil pedidos de refúgio, a Síria (117,1 mil) e o Iraque (113,5 mil), países que têm passado por intervenções militares e onde atuam grupos extremistas, como a autodenominado Estado Islâmico, a Al-Qaeda e o Talebã.
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Na lista da Acnur também aparecem outros países latinoamericanos, como El Salvador (59,4 mil pedidos de asilo), Guatemala (36,3 mil ) e Honduras (34,9 mil), mas a uma distância considerável dos que ocupam as primeiras posições.
Principais países de origem de novos solicitantes de refúgio em 2017
- Afeganistão – 124,9 mil
- Síria – 117,1 mil
- Iraque – 113,5 mil
- Venezuela – 111,6 mil
- Rep. Democrática do Congo – 104,7 mil
Embora reconheça dificuldades para compilar esse tipo de estatística, o relatório sobre deslocamentos forçados estima em mais de 1,5 milhão o número de venezuelanos que saíram de seus países levados pela “difícil situação da segurança, pela perda de rendimentos como consequência da atual situação econômica do país e pela escassez de alimentos e medicamentos”.
Além disso, nesta sexta-feira, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos acusou as forças de segurança da Venezuela de terem matado sem justificativa mais de 500 pessoas desde julho de 2015 e alegou que a lei está “praticamente ausente” do país latinoamericano.
‘Guerra econômica’
A Venezuela também ostenta a maior inflação do mundo.
O Banco Central não publica estatísticas oficiais. Os números que mais se aproximam da realidade são as estimativas da Assembleia Nacional, controlada pela oposição, que calcula que o aumento do preço anualizado até maio foi de 24.571%. A projeção para o ano é de 300.000%.
Mas o governo de Nicolás Maduro considera que se trata de uma inflação “induzida” e parte de uma suposta “guerra econômica” na qual vertentes da oposição e os grandes empresários, com o apoio dos Estados Unidos, supostamente se dedicam a sabotar o país.
Em sua última tentativa de controlar a inflação desenfreada, Maduro ordenou a eliminação de três zeros da moeda, o bolívar. Essa reconversão monetária e o novo cone monetário (conjunto de moedas no país) já deveriam ter entrado em vigor, mas foram adiados para 4 de agosto.
Além da inflação, os que deixam o país estão fugindo de uma grave crise na área da saúde.
Conforme o Parlamento denunciou na terça-feira, mais de 2 mil pessoas com câncer morreram porque não puderam ter acesso a um tratamento adequado nos últimos dois anos.
‘Pessoas de interesse’
O relatório destaca que, embora desde o início de 2015 até o final de 2017 cerca de 166 mil venezuelanos tenham pedido refúgio, há um número maior (mais de 500 mil) que pode se valer de formas legais alternativas para permanecer nos países receptores.
A Acnur observa que a Venezuela lidera a lista em crescimento do número de “pessoas de interesse”, isto é, de cidadãos a quem, além do refúgio, se pode oferecer alguma proteção graças a outros acordos internacionais, regionais ou resoluções da Assembleia Geral da ONU.
“Alguns países da região latinoamericana introduziram mecanismos paralelos ao sistema formal de refúgio para que cidadãos venezuelanos residam por um longo período (de um a dois anos) nos países de destino, com acesso a trabalho e a serviços sociais. Esses mecanismos incluem autorizações de residência temporária, vistos de migração de trabalhadores, vistos humanitários e acordos de vistos regionais”, destaca o relatório.
A agência da ONU estima que em 2017 o número de venezuelanos nessa situação aumentou em 345,6 mil pessoas.
Aonde eles vão?
No caso específico do refúgio, a Acnur ressalta que o país do mundo que mais recebeu pedidos de venezuelanos em 2017 foi o Peru (33,1 mil), seguido pelos Estados Unidos (29,2 mil), Brasil (17,9 mil), Espanha (10,6 mil), Panamá (4,4 mil), México (4 mil) e Costa Rica (3,2 mil).
Países que receberam maior número de pedidos de refúgio de venezuelanos em 2017
- Peru – 33,1 mil
- Estados Unidos – 29.250
- Brasil – 17,9 mil
- Espanha – 10,6 mil
- Panamá – 4,4 mil
- México – 4 mil
- Costa Rica – 3,2 mil
No entanto, um número maior de venezuelanos pode se encaixar na categoria de pessoas de interesse, em países como Chile (84,5 mil), Colômbia (68,7 mil), Argentina (56,6 mil), Panamá (48,9 mil), Equador (41 mil), Peru (31,2 mil), Brasil (8,5 mil) e Uruguai (6,2 mil).
Apesar desses números elevados, a ACNUR estima que a maioria dos cidadãos que deixaram a Venezuela nos últimos anos esteja em situação irregular.
Esta situação preocupa o organismo, que adverte que, “sem acesso a um estatuto legal, eles estão mais expostos à violência, à exploração, ao abuso sexual, ao tráfico de pessoas e à discriminação”.
Fonte: BBC