Anúncios
A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aprovou por unanimidade nesta quinta-feira (1) uma resolução que determina a perda temporária do mandato do deputado de Botucatu, Fernando Cury (Cidadania), por 180 dias no processo em que a deputada Isa Penna (PSOL) o acusou de importunação sexual.
Foram 86 votos a favor e nenhum contra; nenhuma abstenção e nenhum voto em branco. A suspensão é inédita na Casa Legislativa paulista e ocorreu após consenso no Colégio de Líderes.
Anúncios
Em dezembro de 2020, uma câmera de segurança da Alesp flagrou quando o deputado passou a mão no seio da colega no plenário, em um abraço por trás, durante a votação do orçamento do estado para 2021.
A punição de seis meses implica a paralisação do mandato e do gabinete de Cury, com a consequente posse do suplente, que poderá formar sua própria equipe. Quem deve assumir é o ex-deputado Padre Afonso (PV), que integrava a coligação que elegeu o deputado em 2018.
Anúncios
Em nota, Isa Penna comemorou a decisão e disse que a Assembleia não aceitará o assédio (leia mais abaixo).
A decisão que aprovou nesta quinta a resolução é inédita na Alesp – nunca um deputado foi suspenso. A Casa tem um episódio de cassação, em 1999, do ex-deputado Hanna Garib, acusado de envolvimento na chamada “Máfia dos Fiscais”.
A suspensão por seis meses é uma punição mais dura do que a sugerida pelo Conselho de Ética da Alesp, prevista inicialmente para 119 dias. O período, porém, não traria impactos ao mandato de Cury, umas vez que permitiria a continuidade dos trabalhos no gabinete e a manutenção de verba. Uma reunião ocorrida na manhã desta quinta com o Colégio de Líderes conseguiu alterar o prazo, acordando a suspensão por 180 dias.
Quando o caso chegou ao plenário da Casa, o novo presidente, Carlão Pignatari (PSDB), chegou a tentar impedir que os deputados propusessem punições mais duras a Cury, e indicou que eles deveriam se ater ao parecer do Conselho de Ética.
Pignatari se mostrou mais flexível depois que os deputados Isa Penna e Emidio de Souza (PT) acionaram a Justiça para análise da medida pelo desembargador Francisco Casconi, do Órgão Especial, que poderia entender que houve desrespeito às Constituições Federal e Estadual.
Além disso, a primeira sessão de discussões sobre a punição de Fernando Cury ocorreu nesta quarta-feira (31), e a maioria dos deputados que conseguiu falar criticou a punição de 119 dias e solicitou que o presidente Casa permitisse a inclusão de emendas ao parecer do Conselho de Ética.
Barros Munhoz (PSB), que foi presidente da Alesp por duas vezes, lembrou que o regimento da Casa determina que todo projeto comporta emendas.
Janaina Paschoal (PSL), que é professora de Direito Penal na Universidade de São Paulo (USP), argumentou que a cassação de Cury tem fundamento com base nas Constituições Federal e Estadual.
Veja a nota de Isa Penna sobre a decisão
“É um momento histórico dentro da história do Parlamento Paulista. Foram 86 votos a zero pela punição e e suspensão de mandato do Deputado Fernando Cury. Lutamos pela cassação desde o primeiro momento, mas o Conselho de Ética tinha decidido apenas pelo afastamento de 119 dias. Porém, com popular das mulheres, da popular, da sociedade civil, além de artistas, juristas, e outras deputadas e deputados de ALESP, foi possível construir uma pena maior, mais dura, e com o Plenário sendo soberano. Minha equipe também foi fundamental nesse processo que se estendeu de dezembro até agora. Deixamos um recado para a sociedade: a Alesp não aceitará assédio, nós mulheres não iremos aceitar assédio, seja ele moral, sexual ou psicológico! Estaremos lado a lado com todas as mulheres.”
Outras investigações
Fernando Cury também é alvo de uma investigação criminal sobre o caso aberta pelo Ministério Público de São Paulo e autorizada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, já que todo parlamentar tem foro privilegiado em São Paulo.
No pedido de investigação, a Promotoria informou que “os fatos, em uma preliminar análise, podem ter contornos de infração criminal” e de “crime contra a liberdade sexual”, precisando, portanto, de “abertura de investigação criminal para a oitiva das testemunhas indicadas com a finalidade de angariar elementos de elucidação dos fatos”.
O deputado estadual também é alvo de um processo disciplinar no partido dele, o Cidadania. Fernando Cury foi afastado das funções dele no partido em 18 de dezembro, após a repercussão do caso.
O Cidadania considerou que o episódio de importunação sexual na Alesp foi “desrespeitoso, afrontoso e deve ser combatido”, e o Conselho de Ética da legenda recomendou ao Diretório Nacional a expulsão do parlamentar do partido.
A expulsão de Cury seria decidida na reunião do Diretório Nacional no dia 13 de janeiro, mas o encontro foi suspenso por ele ter conseguido uma liminar na Justiça de Brasília para suspender o processo interno. A juíza Thassia de Moura Guimarães, da 20º Vara Cível de Brasília, entendeu que o processo contra o deputado deveria primeiro ser direcionado para a Alesp, no âmbito estadual do Cidadania em São Paulo. Depois disso é que ele deve ser analisado no âmbito nacional.
Apoio de personalidades
Pessoas físicas e organizações da sociedade civil lançaram a campanha virtual “Por uma punição exemplar” para que a população pressione os deputados paulistas a aplicarem uma punição mais dura a Fernando Cury.
Até esta quinta-feira (1), mais de 40 mil pessoas tinham aderido à campanha, entre elas artistas e intelectuais brasileiros, que fizeram publicações nas redes sociais.
“O assédio, realizado durante uma sessão parlamentar, diante do presidente da Casa, testemunhado por outros deputados e registrado em foto e vídeo, não pode ser tratado com leviandade. Significa premiar o machismo e a cultura da esperteza; na verdade, a cultura da delinquência. Há uma diferença flagrante entre a foto e o vídeo. Vista com inocência, a foto mais se parece com um casamento civil com os noivos abraçados. Já o vídeo deixa clara a intenção de assédio e de humilhação por parte do deputado”, disse a historiadora Lilia Schwarcz.
“Esse tipo de atitude é inaceitável, injustificável, e não podemos nos acostumar com essas coisas. Homens como ele não me representam. Estou ao lados das mulheres e de Isa”, declarou Nando Reis.
A apresentadora Ana Maria Braga também aderiu a campanha: “Estamos aqui lutando pelo direito da mulher, não só da Isa. Esse é um fato público, mas e todos aqueles episódios que a gente não vê, que estão nos ônibus, que a mulheres não têm com quem falar ou quem as defenda? A gente precisa tomar consciência de que o que ele fez agride todas nós”.
“Primeiro xingam, dizem coisas como ‘só não lhe estupro porque não merece’, chamam de louca, inventam mentiras e agora assediam sexualmente. E sem nenhum pudor! Até que ponto iremos relevar esse tipo de comportamento por parte de parlamentares?”, questionou a atriz Patrícia Pillar.
Fonte: G1