26 de novembro, 2024

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Como os maçons brasileiros se mantêm tão discretos se há mais de 200 mil entre nós?

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Sociedade secreta até o século 19 no Brasil, mistérios e segredos rondam a Maçonaria desde sua origem mundial, datada oficialmente de 1717. Por conta de alguns costumes e perseguições do passado, muitas lendas e mitos sobre a irmandade ainda permanecem.

Mas, na realidade, mudanças bruscas aconteceram ao longo dos séculos na postura dos maçons, sobretudo quanto ao anonimato dos irmãos, como se tratam mutuamente os adeptos.

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Segundo um artigo do maçom Fabio Pedro-Cyrino, secretário estadual de orientação ritualística de uma das maiores organizações maçônicas do Brasil, o Grande Oriente de São Paulo, existem 214 mil maçons brasileiros. No mundo, esse número é de aproxima de 2,3 milhões de irmãos, somando apenas as 15 maiores potências maçônicas da Terra.

Para se ter uma ideia numérica, se fosse um país, a Maçonaria seria uma das 150 nações mais povoadas da Terra. Écomo se todo o estado de Mato Grosso do Sul fosse maçom. Mas como tanta gente se mantém secreta há 300 anos?

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Para início de conversa, a irmandade nem é mais tão secreta assim. “Hoje várias informações são públicas. Se você perguntar para um maçom, ele não vai dizer que é secreto, mas que é discreto”, esclareceu ao VIX a historiadora Pilar Gomez, pesquisadora da Universidade de São Paulo que há quatro anos estuda a maçonaria no Império do Brasil.

Isso vai de encontro com o que escreveu o autor Martin Short em seu livro “Inside the Brotherhood”, sem tradução no Brasil. “Os maçons já foram secretos. Ao longo do século 20, passaram a se definir como discretos. Hoje, caminham para se tornar uma sociedade civil aberta”.

Além disso, como destaca Gomez, há na internet informações abertas e oficiais sobre locais dos encontros e horários das reuniões.“As lojas do Rio de Janeiro informam os horários de todas as reuniões, a própria maçonaria divulga essas informações”, exemplifica a historiadora se referindo aos locais de encontros maçônicos, as chamadas “lojas”.

Os nomes de todos os afiliados não são divulgados, mas dos principais chefes e secretários estão disponíveis para consulta. Porém, o que se passa dentro das reuniões, as discussões entre os irmãos e o teor dos encontros permanece sendo um segredo compartilhado somente entre os maçons.

Adesivo de identificação e ajuda mútua

Há entre os maçons um preceito básico de ajuda mútua entre os irmãos, seja qual for a necessidade. Uma forma de serem reconhecidos principalmente entre eles próprios sem precisar gritar por aí que são maçons é usando adesivos com símbolos da ordem em seus carros.

Assim, se um irmão estiver passando qualquer perrengue na rua – seja falta de gasolina, pneu furado, furto ou roubo – qualquer outro maçom que estiver passando por ali tem a obrigação de parar e prestar ajuda, “nem que seja só para esperar o guincho”, explica Pilar Gomez

Origem mais remota: maçonaria como sociedade secreta

Algo que pode ajudar a elucidar os motivos pelos quais, até hoje, acredita-se, erradamente, que a Maçonaria se mantém no anonimato está relacionado à sua origem mais remota, lá no fim da Idade Média.

 

Naqueles tempos, os pedreiros da época ajudaram a formar a ordem. Por terem conhecimento da edificação de igrejas, monumentos e castelos, eles eram os engenheiros, arquitetos e empreiteiros do momento. Seus segredos arquitetônicos eram transmitidos apenas para os aprendizes, pois tinham receio de terem suas técnicas roubadas por rivais. Mesmo assim, eles começaram a se encontrar para trocar informações e técnicas de engenharia entre si, em uma rede de confiança.

Uma característica da profissão na época era estar sempre viajando a trabalho, o que dava aos pedreiros certa liberdade em relação a outros ofícios medievais. É daí que surge o nome da ordem em inglês: “freemasonry”, ou pedreiros (“mason”) livres (”free”).

De acordo com uma pesquisa publicada pela USP e feita por Tania Andrade Lima e Marília Nogueira da Silva, do departamento de antropologia do Museu Nacional, as bases da Maçonaria moderna foram fundadas em 1717. “[Foi] quando se esboçou uma mudança nas suas estruturas, sobretudo na Escócia, Irlanda e Inglaterra”.

Antes disso, as aulas entre os pedreiros começaram a se tornar verdadeiros fóruns de encontro e quem saia dali não podia revelar os segredos e técnicas aprendidas. As reuniões aconteciam dentro das “lojas” e, em 1717, quatro delas se fundiram na chamada Grande Loja de Londres.

As pesquisadoras analisam que a partir disso outros profissionais ingressaram à ordem. “Provavelmente para contornar a falta de recursos, as lojas operativas começaram a aceitar estranhos ao ofício da construção como membros honorários, entre eles nobres, mecenas, intelectuais, filósofos, etc., que passaram a ser designados como maçons aceitos”.

“De início pouco expressivos, mais interessados na teoria que na prática, eles se expandiram numericamente de uma tal forma que suplantaram os profissionais dos ofícios construtivos, nascendo então uma nova Maçonaria, constituída quase que exclusivamente por aceitos”.

Maçonaria brasileira do século 18 era restritiva

“É completamente diferente lidar com a maçonaria do século 18 e a do século 21”, analisa Gomez. Assim que surgiu no Brasil, a prática era tida como sociedade secreta e, por isso, não podia existir.

Todas as organizações civis eram obrigadas, pela lei da época, a entregar listas com os nomes dos participantes. Como a Maçonaria não fazia isso às autoridades regulatórias do século 18, foi considerada como proibida e secreta. Isso aumentou a aura misteriosa, já que os irmãos precisavam se manter anônimos.

Tendo em vista a experiência maçônica de outros países, é possível dizer que a lei brasileira dos séculos 18 e 19 foi bem pesada com a ordem. “Havia muita restrição, eles sentiram o peso do estado”, avalia a historiadora.

Brecha em lei no século 19 limitou o segredo

Em sua pesquisa, Pilar Gomez analisou que uma brecha na lei favoreceu a boa existência da Maçonaria sem entrar em choque com a constituição da época. É que, a partir de 1832, o código criminal instituiu que se um juiz de paz não exigisse a lista com nomes dos participantes de qualquer organização, ela não era obrigada a entregar.

“Então, no século 19, a Maçonaria se torna muito mais pública e influencia bastante as elites”, explica Gomez. As lojas maçônicas passaram a ser frequentadas como encontros sociais das elites, que viam nas reuniões uma oportunidade de “circulação de sociabilidade”.

A ordem passou, então, a ter uma vertente dupla: manteve sua característica filosófica de séculos, com preceitos de ajuda mútua e contra absolutismos, e adicionou a isso um caráter de encontro social no qual as opiniões poderiam ser expressas sem receio de represálias (“Era proibido criticar o imperador em público”) e até acordos comerciais eram fechados dentro das lojas.

Fonte: Vix

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