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O Brasil possui um terço de seu território modificado pela ação humana, afirma novo levantamento feito pelo coletivo científico MapBiomas, publicado nesta quarta-feira (21). O documento chama a atenção para uma aceleração nos últimos 40 anos, quando a ocupação de vegetação nativa e outras áreas naturais pulou de 20% do país em 1985 para os atuais 33%. Só a Amazônia perdeu uma área equivalente à França.
O uso do solo nas áreas impactadas é principalmente direcionado à agricultura e pecuária, sendo que apenas as pastagens brasileiras ocupam 19,35% do território nacional, ou 165 milhões de hectares, enquanto a agricultura se espalha por 61 milhões de hectares, ou 7,17%. Áreas urbanizadas correspondem a pouco mais de 4 milhões de hectares, um terreno próximo a 0,5% do território nacional, segundo dados de 2023.
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Como base de comparação, pesquisas do MapBiomas na América do Sul apontam que na Argentina o percentual de vegetação nativa é de 70% do território do país, situação próximo da brasileira (64,5%). No Uruguai, o avanço da agricultura e silvicultura causou uma redução de 10% de áreas naturais em 20 anos (2000-2019).
Segundo os dados do MapBiomas, a perda histórica de áreas naturais no Brasil até 1985 totalizava 20% do território. Nos 39 anos seguintes (1985-2023), essa perda avançou para outros 13% do território (110 milhões de hectares), totalizando em 2023 a marca de 33%. Metade desse total ocorreu na Amazônia. Ao mesmo tempo, outras regiões registraram ganho de vegetação nativa.
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Raio-X do uso do território
- Brasil tem 64,5% do território coberto por vegetação nativa
- Em 1985, essa cobertura era de 76%
- Entre 1985-2023, área de pastagem expandiu 79%, ou 72,5 milhões de hectare
- Área da de agricultura cresceu 228%, ou um acréscimo de 42,4 milhões de hectares
- Em 1985, 48% dos municípios tinham o predomínio da agropecuária
- Em 2023, esse predomínio chegou a 60% dos municípios
- Mais da metade (60%) da perda de vegetação nativa no país está em propriedades privadas
Regiões com aumento de vegetação
Em nível nacional, 18% dos municípios tiveram estabilidade entre 2008 e 2023, período em que dados municipais foram analisados pelo MapBiomas. Em outros 37%, houve ganho de vegetação nativa.
O bioma com maior percentual de municípios onde a área de vegetação nativa cresceu nesses 16 anos foi a Mata Atlântica: 56%.
Os estados com maior proporção de municípios com ganho de vegetação nativa são Paraná (76%), Rio de Janeiro (76%) e São Paulo (72%).
Dos 27 estados da federação, apenas o Rio de Janeiro teve aumento de vegetação nativa no período avaliado, que passou de 30% para 32% de seu território. Os demais 26 estados tiveram redução, sendo que as mais expressivas foram em Rondônia (de 93% em 1985 para 59% em 2023), Maranhão (de 88% para 61%), Mato Grosso (de 87% para 60%) e Tocantins (de 85% para 61%).
Os estados com maior proporção de vegetação nativa são Amapá (95%), Amazonas (95%) e Roraima (93%). Já os estados com menor relação são Sergipe (20%), São Paulo (22%) e Alagoas (23%).
As áreas mais preservadas do Brasil continuam sendo as Terras Indígenas (TIs), que cobrem 13% do território nacional. De 1985 a 2023, elas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas foram 28%.
Perda de áreas naturais por município
O bioma com mais municípios com perdas de áreas naturais é o Pantanal, com 82%. O bioma foi afetado não só pelo uso do solo, mas pelo recuo das águas, que compõem as áreas naturais. Em 2023, o recuo dos rios em relação à média histórica foi de 61%, segundo relatório anterior do MapBiomas.
Já os estados com maior proporção de municípios com perda de vegetação são Rondônia (96%), Tocantins (96%) e Maranhão (93%). Quase metade dos municípios brasileiros (45%) perderam vegetação nativa no período.
No caso da região do Matopiba, no Cerrado (área que reúne os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), todos os estados têm pelo menos um município com mais de 30% de perda de vegetação nativa entre 2008 e 2023.
O Pampa é o bioma com a maior proporção de municípios com perdas acentuadas (superior a 15%) de vegetação nativa, com uma queda de 35% desde 1985.
Avanço da agropecuária nos biomas 1985-2023 (porcentagem do território)
- Mata Atlântica: de 63% para 65%
- Cerrado: de 28% para 47%
- Pampa: de 28% para 45%
- Caatinga: de 28% para 38%
- Pantanal: de 5% para 17%
- Amazônia: de 3% para 16%
Para Júlio Esquerdo, pesquisador da Embrapa Agricultura Digital, que não participou do levantamento do MapBiomas, dados de uso do solo disponíveis apontam que a agricultura tem aproveitado áreas de pastagens para se expandir. Coordenador da plataforma TerraClass, o especialista ponta que na Amazônia e no Cerrado, entre 2018 e 2022, a agricultura anual foi ampliada em 22%, com 94% dessa expansão sobre usos agropecuários já consolidados, principalmente sobre áreas de pastagem.
“Neste período, aproximadamente 1% desta expansão se deu sobre áreas de vegetação natural primária e secundária. Estes resultados dão um sinal de que o crescimento da agricultura nestes dois biomas ocorreu prioritariamente sobre as pastagens, indicando que a agricultura tem se expandido sobre áreas já antropizadas e poupado a necessidade de abertura de novas áreas naturais. A abertura de novas áreas para pastagem continua sendo a principal atividade responsável pela conversão da cobertura vegetal natural”, afirma Esquerdo.
“Com relação a como conciliar a atividade econômica agropecuária e a preservação, nós reforçamos a importância de incentivar a adoção de tecnologias mais sustentáveis, como por exemplo sistemas integrados e a própria recuperação de áreas degradadas, e a promoção de políticas para gestão territorial voltadas à redução da pressão pela abertura de novas áreas de cobertura vegetal natural ou, ainda, outras políticas que restrinjam acesso ao mercado de produtos oriundos de áreas desmatadas”, Júlio Esquerdo, pesquisador da Embrapa
Perda de áreas naturais por bioma
Em área total, Amazônia e Cerrado são os biomas que mais perderam área de vegetação nativa. Na Amazônia, foram 55 milhões de hectares, área similar à da França, e uma redução de 14% nos últimos 39 anos. Com isso, a grande floresta tropical brasileira tem hoje 81% de sua extensão coberta por florestas e vegetação nativa. A área inclui 8,1 milhões de hectares de vegetação secundária, que cresceu novamente depois de ser desmatada.
O levantamento chama atenção que o quadro amazônico está próximo da margem estimada pelos cientistas para seu ponto de não retorno, estimado entre 80% e 75% de vegetação nativa.
No Cerrado, 38 milhões de hectares de vegetação nativa foram suprimidos entre 1985 e 2023, uma queda de 27%. Hoje 10% do bioma (9,7 milhões de hectares) são cobertos por vegetação secundária.
No Pantanal, a redução mais acentuada foi na superfície de água, que compõe a chamada área natural. Essa área passou de 21% em 1985 para 4% em 2023. Como consequência, as regiões de vegetação herbácea e arbustiva aumentaram de 36% em 1985 para 50% do bioma em 2023. Essa vegetação disponível, em tempo de seca e calor, acaba tornando-se combustível, o que faz a região, assim como a Amazônia, registrarem o maior perigo de fogo desde 1980, segundo dados da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
“Hoje você pode ir de carro até a beira do rio Paraguai, está extremamente seco. Então, esse solo passa a ter condições de uso para o proprietário. Uma situação semelhante ocorreu durante os anos 1960 e agora essa tendência ocorre novamente. É preciso usar o conhecimento existente e manter os corredores dos rios e a pastagem nativa, evitando espécies exógenas”, Cátia Nunes, professora da Universidade Federal do Mato Grosso
Proporcionalmente em relação ao próprio tamanho, Cerrado e Pampa são os biomas que mais perderam área de vegetação nativa. No caso do Pampa, a perda entre 1985 e 2023 foi de 28% (3,3 milhões de campos de futebol). Destaca-se ainda o fato de que um quarto da vegetação nativa remanescente do Pampa é secundária.
A Caatinga perdeu 14% de vegetação nativa (8,6 milhões de hectares) entre 1985 e 2023, enquanto quase um quarto do bioma (11,5 milhões de hectares) já são de vegetação secundária.
A perda de vegetação nativa na Mata Atlântica foi de 10%, ou 3,7 milhões de hectares em 39 anos. Com isso, as formações florestais decresceram de 28% para 26% no bioma. As atividades agropecuárias, por sua vez, passaram de 63% para 65%.
Fonte: Um Só Planeta