23 de novembro, 2024

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Artigo: Para Viver para Sempre é preciso Morrer – Por Lourival Panhozzi

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Depois de vencermos a fome e guerras, ainda existentes e remanescentes, a humanidade travará uma luta contra a morte. A imortalidade, que já faz parte de pesquisas e recebe investimentos bilionários, será a última fronteira a ser vencida, isto é o que alguns acreditam. Os últimos dias da morte, contudo, devem demorar a chegar, hoje dependemos dela, precisamos dela para sobreviver. Não estamos preparados tecnicamente, muito menos espiritualmente, para conseguir viver para sempre, mas tem aqueles que querem e querem muito!

Até mesmo as religiões não estão prontas para abrir mão da morte. É ela que consegue arregimentar um exército de soldados crédulos, alimentados pelos misticismos. Tão pouco nossa estrutura familiar e modelo socioeconômico estão preparados. A necessidade de se evoluir em todos os campos da ciência, tecnologia e mesmo da filosofia, também não pode hoje se privar da morte, sob pena de deixar de existir, se tornando elas a própria morte. Em uma citação famosa, o físico Max Plank afirmou que a Ciência avança de funeral em funeral. Eu ouso dizer que a Humanidade avança de funeral em funeral. Nada no mundo que conhecemos pode ficar vazio, a vida já existe e convive com a morte, se a morte deixar de existir, o que irá substituí-la?

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Para um grupo seleto de bilionários, a impossibilidade de ser hoje imortal, ou mesmo “amortal”, fez com que buscassem alternativas. Alguns estão encontrando na tecnologia um método de se manter, mesmo que de forma cibernética, senão vivos, pelo menos conectados.

Uma empresária de sucesso, vamos aqui chamá-la de Augusta, pessoa de grande determinação, sabedora com razoável antecedência que seu prognóstico médico não lhe permitiria envelhecer, tomou uma decisão inusitada e polêmica, iria ela continuar no controle de suas empresas, mesmo depois de sua morte legal, e preparar até mesmo um possível retorno.

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Primeiro autorizou e determinou que seu corpo fosse congelado instantes após sua morte, a espera de uma cura no futuro para sua doença (atualmente 250 pessoas já se submeteram a processo semelhante e mais de 2.500 aguardam “o momento” – alguns acreditam que daqui 200 anos será possível trazê-los de volta a vida). Augusta determinou ainda que, depois de seu corpo passar pelo processo criogênico, um sistema de inteligência artificial por ela contratado e alimentado com todas as suas percepções e conhecimento, fosse inicializado e assumisse o controle de suas empresas, conjuntamente com um conselho administrativo.

Nenhuma decisão pode ser tomada sem que o sistema, que se comunica usando a voz de Augusta, seja consultado, bem como suas decisões somente podem ser contrariadas por um número determinado de votos do conselho. Augusta autorizou a sua Reconstrução Cognitiva, o reconhecimento de sua personalidade digital ainda não foi deferido pela Justiça, por enquanto, e um contrato inteligente a mantém à frente de suas empresas, mas certo até agora é que a Justiça tem amainado os excessos de última vontade, por entender que os mesmos tiram direitos de terceiros e propiciam o enriquecimento sem causa de outros, isto porque, Augusta, para realizar sua “última” vontade, teve que destinar boa parte de sua herança à conservação de seu corpo e manutenção de sua inteligência artificial ativa, bem como, privar seus herdeiros legais de terem pleno controle dos bens.

Não coloco aqui nenhuma crítica a Augusta, nem mesmo  aos que lhe ofereceram os meios para realizar sua vontade. Até mesmo uma criança, que ainda não sabe o que é morrer, não quer morrer.

Nascemos com um instinto de preservação e continuidade, mas aprendemos no entrecho de nossa história a aceitar, que a maturidade nos liberta com a morte, permite que aqueles que amamos ocupem nossos lugares e tenham também a oportunidade de se desenvolver, de tal forma que em algum momento possamos nos reencontrar. Particularmente não tenho nenhum interesse em voltar daqui a 200 anos, quando todos que eu amo, conheço e convivo, não mais aqui estarão, muito menos continuar a trabalhar “ad aeternum”, por meio de um sistema digital.

Minha última vontade é morrer, para que a vida floresça nos meus.Este texto é ficção e realidade, na medida da compreensão e possibilidade de cada um ser seu personagem.

* Lourival Panhozzi é empresário, Diretor Funerario – Pres. Abredif/Sefesp -, Diretor do CTAF, Sistema Prever e Solucard.

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