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Quando ele nasceu foi uma grande correria na maternidade: o bebê não chorou, colocaram ele de ponta-cabeça, deram-lhe três palmadas e chacoalharam, mas ele não chorou. Mas respirou e sobreviveu.
Aos 7 anos, com as mãos trêmulas, sepultou seu cachorrinho, presente de seu primeiro aniversário. No fundo do quintal, ao lado do seu balanço, cavocou com uma colher e o cobriu, com uma terra da qual nunca esqueceu o cheiro. Estava no mais completo silêncio, mas não chorou.
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Aos 12 anos, já era bom de bola, mas o zagueiro era maior. Com os olhos arregalados viu colocarem seu braço no lugar antes de engessar, mas não chorou.
Aos 18 anos, segurou na terceira alça do caixão de seu avô paterno, seguiu o passante da frente, pelas ruas estreitas da necrópole acinzentada, coreografando seus últimos momentos. Com o coração apertado e o sol lhe castigando a testa, parou para enxugar o suor que lhe escorria, mas não chorou.
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Aos 25 anos, filmou o nascimento de seu primeiro filho, e, aos 32 anos, enxugou as lágrimas de sua esposa com o nascimento do segundo, mas ele não chorou. Certa vez, quando a sua idade já não mais era relevante saber, em uma tarde que custava a terminar, era dia do equinócio, ele parou o carro, desceu e caminhou em direção a um mirante, olhou o infinito por um tempo a se perder, e uma lágrima, uma única lágrima, lhe verteu o rosto.
Todos o conheciam naquele lugarejo, sabiam que durante toda sua vida ele nunca havia chorado. Quando a notícia da única lágrima se espalhou todos queriam saber: “Porque? Qual a razão daquela única lágrima?”. Ele nunca contou.
O homem de uma lagrima só faleceu no ano passado, eu estive no seu enterro e chorei, eu choro fácil, choro porque só assim posso saber o valor de um sorriso quando ele chega, choro fácil porque vejo quase todos os dias pessoas chorarem de verdade, choro fácil e paro ainda mais rápido. Acredito que alguns momentos precisam ser vividos intensamente, mas não carregados para sempre.
Existe o momento de chorar, o de enxugar as lágrimas e aquele de seguir em frente. Na vida tudo é movimento, até uma lágrima que carrega toda dor que alguém nunca imaginou poder suportar, uma hora cai e se desfaz. Agora, se você tivesse que durante toda sua vida verter uma única lágrima, por qual motivo seria?Nunca conte a resposta a ninguém, mas também nunca se esqueça desse motivo, ele é a razão de você poder sorrir e viver de verdade.
“O Planeta não precisa mais de pessoas bem sucedidas. Precisa desesperadamente de mais pacificadores, curadores, restauradores, contadores de histórias e amantes de todo tipo. Precisa de mais pessoas que vivam bem em seus lugares. Precisa de pessoas de coragem e moral, dispostas a se juntar para tornar o mundo habitável e humano. E essas qualidades têm pouco a ver com o que temos definido como sucesso”, escreveu David Orr.
Eu acredito ser possível. Um bom início e curso de ano a todos.
*** Lourival Panhozzi é empresário, Diretor Funerario – Pres. Abredif/Sefesp -, Diretor do CTAF, Sistema Prever e Solucard.