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Em um encontro imaginado por mim e que nunca acontecerá, mas que já aconteceu, vejo meu pai sentado em sua cadeira preferida, bigode aparado com cuidado por ele mesmo, o jeito calmo de olhar, mais observando que falando, envolvido pelos meus dois filhos, agora homens que são, refazendo a mesma cena que vi há muitos anos, quando meu pai ainda vivia e meus filhos eram crianças.
O que poderiam estar falando naquele momento? Talvez respondessem às perguntas do avô querido, ouvidos atentos e respostas inesperadas. Mas agora meu pai, interessado como sempre foi ao que os netos faziam, certamente estaria perguntando sobre eles.
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Henrique, quieto e observador como ele, falaria dos planos com sua Keryma que o avô não conheceu, das aulas de literatura que deve estar encantando vários jovens que o assistem, mostraria seus textos que exibem toda sua cultura de um jeito agudo e exuberante. Henrique tem muitos livros como meu pai também tinha. E tenho certeza de que ele entenderia tudo o que o Henrique escreve hoje.
Guilherme, contestador e carinhoso como ele, falaria de suas dúvidas profissionais que surgem na medida que o tempo o aproxima de seu diploma de advogado. Contaria sobre a tradicional “São Francisco” e como será sua formatura em poucos meses.
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E meu pai, orgulhoso, o ouviria com atenção. Guilherme falaria de sua Giovana que o avô também não conheceu antes de discordarem sobre política e políticos e concordarem sobre o São Paulo, time de futebol preferido por ambos.
Este encontro imaginado por mim existiu de verdade e está guardado para sempre em minha memória, com meu pai ainda vivo e meus filhos ainda meninos.
Eram outros assuntos, como o jogo de damas nos quais meu pai cuidadosamente sempre perdia, o fusca velho e desbotado que os três gostavam de passear pela cidade por caminhos que o avô insistia em errar e o cigarro sempre aceso entre seus dedos e que o impediu de conhecer Keryma e Giovana muito anos depois.
Nestas cenas que trago em minha memória e em minha imaginação nunca estou presente.
Mas sei que sou um pouco de cada um deles, como se fosse a mistura improvável destas duas gerações. E lamento não poder mais uni-las diante de mim. E lamento não poder viver isto tudo de novo.
Neste domingo espero um feliz dia dos pais… avós e netos para todos.
Dr André Balbi é médico nefrologista, professor associado de Nefrologia da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB) e atual Superintendente do HCFMB.