Adeus à Yala: enterro simbólico marca desaparecimento acelerado de geleira no Nepal por mudanças climáticas

Na segunda-feira (12), foi realizada uma cerimônia na geleira Yala, na região de Langtang, no Nepal, para marcar o seu desaparecimento acelerado em razão das mudanças climáticas. Yala já encolheu 66% desde que foi medida pela primeira vez, na década de 1970, e deverá ser uma das primeiras geleiras nepalesas a se juntar ao crescente número de enormes formações de gelo declaradas “mortas” em todo o mundo.

Mais de 50 pessoas, incluindo monges budistas e membros da comunidade local, além de especialistas em geleiras do Butão, China, Índia e Nepal, participaram da homenagem.

Na ocasião, duas placas memoriais de granito foram instaladas no sopé de onde Yala está hoje. Uma delas traz uma mensagem do autor Manjushree Thapa e, a outra, do autor Andri Snaer Magnason.

A inscrição de Thapa diz: “Yala, onde os deuses sonham no alto das montanhas, onde o frio é divino. Sonhe com a vida na rocha, nos sedimentos e na neve, na pulverização do gelo e da terra, em poças de água derretida da cor do céu. Sonhe. Sonhe com uma geleira e as civilizações rio abaixo. Ecossistemas inteiros: nosso próprio sustento. O cosmos. E tudo o que conhecemos e amamos.”

Já a de Magnason tem os seguintes dizeres: “Uma mensagem para o futuro: a geleira Yala é uma das 54.000 geleiras no Himalaia Hindu Kush, a maioria das quais deverá desaparecer neste século devido ao aquecimento global. Este monumento serve para reconhecer que sabemos o que está acontecendo e o que precisa ser feito. Só você sabe se fizemos. Maio de 2025, 426 ppm de CO2 [partes por milhão de dióxido de carbono na atmosfera].”

A cerimônia foi organizada pelo Centro Internacional para o Desenvolvimento Integrado das Montanhas (ICIMOD), em colaboração com parceiros das autoridades locais, incluindo o Distrito 4 do Município Rural de Gosaikunda.

Deglaciação e perda de cobertura de neve

Yala é uma das sete geleiras em todo o arco de 3.500 km de extensão da cordilheira Himalaia Hindu Kush que são monitoradas anualmente há uma década ou mais, e é uma das 38 com medições in situ, fornecendo dados cruciais sobre a velocidade e a extensão das perdas.

“O desaparecimento acelerado de Yala é um símbolo da desastrosa deglaciação e perda de cobertura de neve que estamos vendo agora se desenrolar nas montanhas da Terra em um ritmo que ultrapassa em muito os piores cenários dos cientistas”, disse Pema Gyamtsho, diretora geral do ICIMOD.

Shyam Saran, ex-secretário de Relações Exteriores, enviado especial e negociador-chefe para mudanças climáticas da Índia, que participou do evento, observou que o ritmo e a escala da deglaciação e da perda de neve que estão acontecendo agora são “realmente de tirar o fôlego”.

“Tragicamente, as questões que nos dividem hoje, e que estão, com razão, atraindo tanta atenção global agora, estão destinadas a ser ofuscadas pelos tipos de desastres que enfrentaremos se não reconhecermos nossa interconexão com os sistemas ecológicos que nos apoiam e agirmos juntos, pelo nosso futuro comum”, ele enfatizou.

Sharad Prasad Joshi, analista de criosfera do ICIMOD e correspondente nacional do Nepal para o Serviço Mundial de Monitoramento de Geleiras (WGMS), alertou para as implicações da morte da Yala. “O leito rochoso exposto significa que não há mais albedo [fração de radiação solar refletida por uma superfície ou objeto], então isso desencadeará um aumento ainda maior da temperatura. E, claro, a perda desta e de outras geleiras tem implicações para a água, os meios de subsistência e muito mais a jusante”, destacou.

E ele completou: “Esta questão não se refere apenas às geleiras do Nepal. Isso está acontecendo em todo o Hindu Kush, no Himalaia, e no mundo todo. Estamos perdendo nossas geleiras. Yala representa as verdadeiras vítimas – todas as geleiras do Nepal estão recuando – do aquecimento global”.

Fonte: Um Só Planeta