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O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo condenou oito réus acusados de tortura, maus-tratos, estupro de vulnerável e cárcere privado a pacientes de uma clínica particular de recuperação para dependentes químicos de Ilha Comprida, no litoral de São Paulo. Eles também respondem por associação criminosa e, juntas, as penas somam 286 anos de reclusão.
A pedido do Ministério Público, o Centro Terapêutico Ilha Comprida foi fechado em 2015. Mas, antes mesmo da determinação judicial, denúncias se acumulavam em uma página criada em uma rede social contra o tratamento oferecido aos pacientes.
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A decisão que resultou na condenação do dono da clínica e outros sete funcionários foi estabelecida na última semana pelo juiz Guilherme Henrique dos Santos Martins, da 1ª Vara da Comarca de Iguape.
Apontado como o líder da quadrilha, o então dono da clínica, Rafael Alaga Casteluber Renger, foi condenado à pena de 98 anos, três meses e 14 dias de reclusão pelos crimes de associação criminosa, maus-tratos, cárcere privado e tortura.
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Humberto José Massoco de Souza, coordenador responsável direto pela fiscalização da ala de pacientes involuntários, foi condenado a 80 anos pela prática de associação criminosa, maus-tratos, cárcere privado e tortura. As penas dos demais funcionários variam entre quatro e 27 anos (confira abaixo).
Entre os funcionários acusados, três deles eram pacientes, que posteriormente foram convidados pelo dono da clínica a exercer funções no estabelecimento.
Dos oito réus, cinco não poderão responder em liberdade. Outros três podem recorrer em liberdade, mas devem manter os endereços residenciais atualizados, caso contrário, podem ter a prisão preventiva decretada.
Ainda de acordo com o processo, os acusados se associaram na clínica para a prática de crimes, em especial os de tortura, maus-tratos e cárcere privado. O objetivo era garantir a submissão dos pacientes por meio do emprego de violências e graves ameaças, além de intensos sofrimentos físicos e mentais.
Tanto os funcionários como o dono da clínica negaram as acusações, alegando que não há provas suficientes. A reportagem tentou contato com a defesa dos acusados, mas não recebeu retorno até a última atualização desta reportagem.
Rotina de tortura
Segundo consta na sentença, os pacientes eram submetidos a sessões de tortura a cada ato de indisciplina. Eles passavam fome e frio, e não tinham acesso a água potável nem a itens de higiene pessoal. Um dos locais, conhecido como ‘quarto do resumo’, era utilizado para cometer agressões.
Das 34 vítimas citadas no processo, uma delas era um adolescente, internado por dependência química. Os acusados souberam que ele estava planejando fugir e o espancaram com chutes, socos e estrangulamentos.
Depois, ele ficou por mais de dois meses trancado em uma ala com grades. Quando foi liberado pelos funcionários, ele começou a auxiliar no trabalho da cozinha e, em certa ocasião, foi surpreendido por um dos acusados, que o agarrou por trás e o enforcou. O jovem perdeu a consciência e caiu no chão. Mesmo desacordado, ele continuou sendo agredido.
Outro caso é de uma mulher que foi estuprada por dois funcionários. Moradora da capital paulista, ela procurou a clínica para tratamento de dependência química. No dia 16 de maio de 2015, dois funcionários foram buscá-la à força, exigindo que ela ingerisse uma determinada medicação.
No caminho até Ilha Comprida, a mulher informou que precisava urinar. Nesse momento, eles pararam no acostamento de uma rodovia e a estupraram. Em outras ocasiões, já na clínica, a mulher teve as coxas queimadas com cigarro e foi estrangulada – tudo como forma de castigo ao que a equipe da clínica considerava como mau comportamento.
Condenações, segundo o TJSP:
- Rafael Alaga Casteluber Renger
Dono da clínica
Pena: 98 anos, três meses e 14 dias de reclusão
Acusações: Associação criminosa, maus-tratos, cárcere privado e tortura - Humberto José Massoco de Souza
Coordenador, responsável direto pela fiscalização da ala de pacientes involuntários
Pena: 80 anos, dois meses e quatro dias de reclusão, além de seis meses de detenção
Acusações: Prática de associação criminosa, maus-tratos, cárcere privado e tortura - Leandro Mendes Moreira
Era paciente internado e logo após foi convidado pelo dono da clínica a exercer o cargo de monitor nas tarefas de fiscalização dos pacientes
Pena: 21 anos, três meses e 10 dias de reclusão
Acusações: Tortura e associação criminosa - Alessandro Edilson de Paula
Responsável por ‘resgatar pacientes’, permanecia na portaria da clínica e auxiliava os demais monitores
Pena: 27 anos e quatro meses de reclusão
Acusações: Tortura e associação criminosa. - Marcelo Villaça de Almeida
Coordenador da ala dos pacientes voluntários
Pena: 22 anos, cinco meses e 27 dias de reclusão
Acusação: Associação criminosa - Fabiana Nache Borges de Carvalho
Era paciente do centro terapêutico e, um mês depois, foi convidada pelo dono da clínica para atuar como coordenadora da ala feminina
Pena: 15 anos e dois meses de reclusão, além de além de dois meses e 27 dias de detenção
Acusações: Associação criminosa, maus-tratos e tortura - Luiz Carlos Correia
Era paciente da clínica até ser alçado ao cargo de monitor, auxiliando os coordenadores nas tarefas diárias
Pena: Quatro anos e oito meses de reclusão
Acusações: Associação criminosa e tortura - Jaison Aires
Contratado pelo dono da clínica para cuidar da portaria e participar das arrebatações dos pacientes involuntários
Pena: 19 anos, nove meses e 10 dias de reclusão
Acusações: Associação criminosa, estupro de vulnerável e tortura
Fonte: G1