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Nos últimos anos, pesquisas e estudos têm mostrado que o consumo de informação política ocorre majoritariamente pelo celular e por plataformas digitais. Segundo levantamento do DataSenado (2024), 72% dos eleitores afirmam se informar sobre política por meio das redes sociais, enquanto apenas 18% citam televisão ou rádio como principal fonte.
Esse cenário exige das campanhas domínio de linguagem digital, estratégias de microsegmentação, uso de IA e produção de conteúdo capaz de gerar engajamento real. Se antes as campanhas se sustentavam em longos tempos de televisão e rádio, agora é necessário dominar a linguagem digital, que transforma o cidadão em protagonista, disseminador e criador de conteúdo, e não apenas em espectador, segundo o publicitário Zuza Nacif.
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Ele esteve no centro de algumas das campanhas mais disputadas da política brasileira nas últimas décadas. Atuou em eleições presidenciais, estaduais e municipais em diferentes regiões do país. Só em 2024, Nacif leu pesquisas de mais de 100 cidades e conduziu 11 campanhas municipais em Minas Gerais. À frente da Brasil Comunicação, é reconhecido como um dos principais nomes do marketing político e digital do país.
Reportagem: Zuza, por que as eleições de 2026 serão diferentes das anteriores?
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Zuza Nacif: O cenário mudou muito. Destaco cinco pontos: o amadurecimento do ativismo digital, a microsegmentação, a força dos influenciadores locais ou de causa, o uso da inteligência artificial e, por fim, a capacidade de comunicação do político. Hoje não é mais o discurso tradicional que conquista votos, e sim a habilidade de despertar sentimentos e falar com o eleitor, tratando-o como participante ativo da construção da campanha e das propostas. Se antes as campanhas dependiam de longos tempos de TV e rádio, hoje é preciso dominar a linguagem digital, que transforma o cidadão em protagonista, disseminador e criador de conteúdo.
O ativismo digital começou a se organizar em 2013, evoluiu com diferentes disputas eleitorais e debates públicos e, mais recentemente, se manifesta em temas como Pix, questões econômicas internacionais e mudanças legislativas. A população aprendeu a se organizar online para mobilizar, pressionar e participar das discussões políticas. Basta vermos o que aconteceu com a foto da Fernanda Torres no Oscar: ninguém precisou dar um start. As pessoas sabiam que um like mostraria apoio à indicação dela. Isso também acontece em assuntos políticos, seja com likes, views ou envio por WhatsApp.
Em 2024, das 460.613 candidaturas registradas, 372.408 informaram contas em redes sociais, ou seja, 80,9% do total. O Instagram foi usado por 182.927 candidatos, o Facebook por 151.304, concentrando quase 90% das contas, enquanto TikTok e Twitter aparecem com 3,6% e 0,9%, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso mostra claramente a centralidade dessas plataformas nas campanhas e como os políticos precisam se adaptar a esse novo tempo. Também é importante considerar números do WhatsApp nessa avaliação.
Reportagem: Como essa segmentação funciona na prática?
Zuza Nacif: Funciona com micro e médios influenciadores locais ou de causas. A comunicação eficiente acontece quando as mensagens circulam em perfis, grupos e postagens com os quais o público se identifica. É volume e frequência. Mesmo grandes influenciadores dependem dessa rede para viralizar. Para a política, significa entrar nas bolhas certas e adaptar o conteúdo à linguagem de cada público. Quando bem feito, isso representa uma oportunidade real para o político.
Reportagem: Os políticos estão conseguindo se adaptar a essa nova lógica?
Zuza Nacif: A maioria ainda fala como se estivesse em comícios antigos. A linguagem é majoritariamente analógica. Muitos opinam sobre temas amplos tentando atingir todo mundo, mas pesquisas mostram que isso é visto como oportunismo. Os que se destacam são os que debatem assuntos do cotidiano. O brasileiro quer ser ouvido. Ele não quer apenas validar o discurso do político, quer participar e sentir que está sendo representado.
Reportagem: E o papel dos influenciadores nesse processo?
Zuza Nacif: Eles são fundamentais. Quando um tema chega a uma bolha com linguagem e formato que as pessoas reconhecem, se integra à rotina delas. Um bom exemplo foi a mobilização sobre mudanças legislativas recentes: nomes maiores anunciaram, mas o movimento só ganhou força quando perfis médios e pequenos ajudaram a gerar volume e frequência, reforçando a credibilidade.
Reportagem: Como identificar esses influenciadores estratégicos?
Zuza Nacif: Ferramentas de inteligência artificial ajudam a mapear perfis e mostrar quais assuntos importam para cada grupo. Mas mobilizá-los depende de estratégia humana. Perfis médios, com 10 a 20 mil seguidores, podem alcançar milhões em semanas. Não é só sobre grandes nomes; é sobre relevância dentro de cada segmento.
Reportagem: Falar de forma segmentada significa defender mais causas?
Zuza Nacif: Significa tratar temas de forma transversal e adaptada. Por exemplo, ao invés de falar genericamente sobre emprego, é discutir políticas que apoiem quem quer empreender. Em saúde, não basta mencionar a falta de especialistas; é propor formas de otimizar o tempo que a pessoa leva para sair de casa, pegar transporte, esperar em filas, pagar um lanche e voltar para casa. Os princípios que norteiam as demandas do cidadão hoje não são apenas ter uma consulta ou mais professores, mas garantir tudo isso de forma que corresponda à rotina da vida moderna.
Reportagem: Qual é o papel da inteligência artificial nesse cenário?
Zuza Nacif: A IA é fundamental. Ela cruza dados de redes sociais, pesquisas e histórico de temas, permitindo entender não só o que o eleitor pensa, mas como reagiu ao que foi apresentado a ele. Com isso, é possível direcionar a comunicação certa para cada grupo, seja em grandes centros, no interior, entre estudantes ou grupos específicos.
Reportagem: E como a comunicação digital evoluiu entre diferentes grupos?
Zuza Nacif: Alguns se organizaram cedo, criando estruturas digitais bem definidas para ocupar redes como X e Facebook. Outros adotaram uma lógica mais comunitária, com presença constante e linguagem próxima do cotidiano, abordando tanto política quanto temas ligados à vida, família ou cultura.